Linguagem Guilhotina #19 - De volta para casa
Edição na qual este vosso escriba tenta retomar a newsletter
No comecinho do mês de agosto, finalmente voltei para casa.
Embora toda a temporada do meu pós-doc em Princeton tenha sido incrível e muito proveitosa, já era hora de voltar. As saudades apertaram, de verdade. Sinto que mal consegui processar todos os desdobramentos da minha experiência no exterior. Mal tive tempo de deitar na minha rede e pensar na vida, porque minha rotina entrou em um modo acelerado como poucas vezes vivi em anos recentes. Eu já esperava que fosse assim; creio que, a partir de agora, as coisas sossegam mais.
Não estou reclamando.
Muito pelo contrário! Que bom que o trabalho floresce e que em poucas semanas muitas coisas bonitas estejam acontecendo na minha vida. Na verdade, pela primeira vez em bastante tempo, posso dizer para vocês que há uma convergência entre um ótimo momento profissional e um ótimo momento da minha vida privada. E que bom que me organizei para voltar a conversar com vocês por aqui, não é? Também estava sentindo falta de escrever minhas guilhotinices.
Há muitas novidades para contar, mas como não sou besta, não vou compartilhar tudo de uma vez. Por outro lado, como o tempo está menos livre do que nos meses anteriores, vou me comprometer a atualizações mensais ou, no máximo, quinzenais. De qualquer modo, convido vocês a me acompanhar nas redes sociais, ou me dar um oi através delas ou pelo meus e-mails.
Confesso a vocês que não tenho exatamente uma “pauta”, ou melhor, uma temática a guiar boa parte desta edição, método que tenho usado de forma predominante nesta newsletter.
Vou aqui escrevendo o que me vier à cabeça.
💾 Duas newsletters bem legais
É possível existir ensaísmo de qualidade no universo do substack?
Não há dúvidas que sim. Quero indicar a vocês duas muito boas, escritas por duas escritoras habilidosas. Vocês não vão encontrar os textos delas necessariamente em um contexto acadêmico brasileiro, ou no jornalismo cultural mais tradicional.
As duas newsletters que indico nesta edição são a Segredos em Órbita, de Vanessa Guedes e A Diletante, de Ariela K. O que me chama atenção em ambas é o quanto há uma liberdade tanto na escrita, quanto nas escolhas temáticas destas newsletters, que sem dúvida configuram o espaço criativo digno de ser chamado de “ensaio”. Embora as duas newsletters tenham temas recorrentes, ao mesmo tempo em muitos momentos fico bem feliz de ver os textos me surpreendendo com conexões das quais eu nunca poderia imaginar. Recomendo bastante a leitura das duas autoras, que não conheço pessoalmente, nem fazem parte do meu ciclo de amizades próximo.
👨🏻🏫 Dar aulas
Outro pensamento solto: entre diferentes temáticas que tenho pensado em abordar nesta newsletter, uma delas é a de pensar sobre a vida docente. Não falei muito de aulas, porque esta newsletter nasceu no primeiro semestre de 2023, quando, depois de 8 anos, passei um semestre sem dar nenhuma aula no Mackenzie, onde sou professor, nem em algum curso fora da universidade.
Pensar e compartilhar a vida docente é algo que eu gosto de fazer bastante e me pergunto se agora, que voltei com tudo às salas de aula, não pode ser legal compartilhar com vocês algo desta experiência. Em setembro, aliás, tenho um baita desafio, que é o de dar pela primeira vez na vida aula de escrita criativa.
Sim, é isso que vocês leram. Nunca dei aula de escrita criativa na vida. Soa estranho um escritor dizer isso, porque, na verdade, muitos autores e autoras iniciam a carreira na educação dando aulas de como escrever. Por que eu nunca dei um curso de escrita? Em parte porque minha carreira, de tão errática, teve muitos momentos de obscuridade que não criaram condições para que convites surgissem. Em parte, porque senti que primeiro precisava rodar bastante neste meio literário/editorial (e, acreditem, eu transitei muito por diferentes espaços e experiências, digo isso sem medo de parecer esquisito), enfim, acumular experiência dentro e fora da labuta com a escrita.
Mas o principal motivo é que me esquivei desta função, porque eu acreditava (ainda acredito?) que o panorama de cursos de escrita criativa, ao menos aqui em São Paulo, ou no ensino online, está bem saturado… Também pensava comigo: o que danado eu vou ensinar que Fulana ou Sicrano não poderiam ensinar melhor? Sempre enxerguei que minha vocação como professor estava mais ligada ao ensino da teoria, da historiografia e da análise literária acadêmicas… Mas o convite que recebi foi irrecusável e na próxima edição falo mais do curso para vocês, que já divulguei meses atrás em uma edição anterior desta newsletter.
Aliás, eu sou de uma época em que falar de escrita criativa era tabu.
Havia um discurso forte, até mesmo entre escritores, de que aulas de escrita não eram algo necessário ou bem-vindo. Sim, éramos, aqui no Brasil, atrasados desse jeito. Eu leio a resistência à escrita criativa como um traço do anti-intelectualismo que ainda viceja com força em parte do nosso meio cultural. Além disso, tudo em nosso país parece ser uma luta para manter o seu micro-quintal de privilégios: como assim seria admissível democratizar o acesso a ferramentas que tornem mais pessoas escritores/escritoras?! Esta é uma discussão do passado, porém.
Me digam depois se acham legal a gente falar de vez em quando sobre dar aula de literatura. Eu tenho algumas coisas para compartilhar, com certeza!
💀 Algum conto novo na praça?
Sim! Com muito orgulho publiquei um conto inédito no site do Itaú Cultural. Com curadoria do escritor e pesquisador Enéias Tavares, o Itaú tem dado espaço para que sejam publicados contos inéditos, mensalmente, de escritores de diferentes vertentes da literatura fantástica brasileira.
Tive muitas dificuldades em escrever este, porque, como já disse em várias entrevistas, até recentemente não conseguia retomar a escrita da ficção. Ali por volta de fevereiro, porém, a energia criativa foi voltando e consegui dar conta de alguns contos encomendados, cuja publicação acontecerá em antologias neste ano, ou no próximo.
“Uma noite na taverna” é o título do meu conto publicado no site do Itaú. Ele é mais uma coleção de pequenos assombros, do que exatamente uma narrativa com desenvolvimento mais tradicional. A noite de conversas narrada no conto de fato aconteceu em Princeton, bem como a maioria dos personagens são inspirados em pessoas reais que estiveram comigo na noite em questão.
Quem acompanha meu blog, sabe que já postei sobre o processo e pesquisa da escrita deste conto. Na verdade, o processo rendeu dois contos. O segundo conto, que tem umas 30 páginas, está na gaveta e me ocupou bastante em Princeton, após eu finalizar os compromissos mais acadêmicos por lá. Não voltei ainda a rever esta narrativa, até porque não sei se ela é autônoma, ou parte de algo mais amplo, um romance, por exemplo.
Falando em romance… tentei duas vezes e, por enquanto, não sei se segue em frente. Mas espero voltar a trabalhar no que é com certeza meu próximo livro, um conjunto de ensaios sobre literatura brasileira e que dialoga com ensaios nos quais eu penso palavras-chave do contemporâneo e as coloco em diálogo com nossa literatura.
Ficou curiosa(o) para ler “Uma noite na taverna"? É só clicar aqui.
🛸 Agenda: qual o próximo evento?
Pensei que vocês nunca perguntariam! Vou participar pela primeira vez da programação principal da Bienal do Livro do Rio de Janeiro, que este ano completa 20 anos de existência. Semana passada, estive em um momento muito bonito na Feira Internacional do Livro de Ribeirão Preto, experiência que merece uma postagem à parte. Várias turmas da rede estadual da região leram meus contos e apresentaram trabalhos sobre eles. Não há nada mais importante que possa acontecer com o nosso trabalho do que isso, acredito.
Minha mesa na Bienal será dia 03/09, às 14h. O tema é a literatura fantástica nacional. Estarei acompanhado das escritoras Carol Chiovatto, Paola Siviero e Ana Cristina Rodrigues. Bora? Após a mesa, vai rolar sessão de autógrafos dos nossos livros. De agosto até novembro, tenho pelo menos dois eventos literários, um dentro de São Paulo, outro sempre fora do estado, agendados.
Fico feliz que possamos recomeçar a nossa conversa. Curtiu a newsletter? Se puder, indica para os amigos, compartilha, pensa em assinar para não perder nenhum conteúdo. Até as próximas semanas!
C.
Rapaz, comoartilha sim coisas da sua experiência docente! Esse lugar da sala de aula é sempre fonte de boas reflexões.
Por favor, escreva sobre as aulas de literatura. E parabéns pela publicação do conto :) Eu li o Gótico Nordestino no início do ano e adorei, foi um livro que me deixou bem feliz e com a sensação de que a literatura insólita brasileira tem vida para além dos círculos do (ex-)Twitter.
No mais, fiquei tão surpresa de ver meu nome aqui.. que honra! Muito obrigada.
Quando eu estiver em São Paulo e for sair com a Ana, vou pedir pra ela te chamar haha
Abraço e bom retorno ao nosso Brasilzão 😊