7 Comentários
Nov 10, 2023Gostado por Cristhiano Aguiar

Me considero uma pessoa bastante política e gosto de ver debates politizados sendo levantados, principalmente em situações que normalmente não se esperam. Entretanto, concordo em parte com a ideia que exprime aí, para mim a Queda da Casa de Usher foi no ponto, me agrada demais os longos monólogos, mas se ampliarmos para fora disso, conseguimos perceber que tem se tornado um padrão no meio cinematográfico. Tudo hoje demonstra ter a necessidade de passar uma mensagem politica nítida e desenvolvida, um pauta social critica, precisa ter uma bandeira e necessita de explicações mastigadas. Sinto falta de obras que terminam sem você entender muito bem o que acabou de ver, que provocam discordâncias nas interpretações tamanha suas ambiguidades, que grudam na sua cabeça querendo mais e que não se incomodam de trazer clareza, de por sob os holofotes todos os pontos e nos faça mastigar e remoer essas dúvidas até o fim dos tempos. Acredito que o Mike conseguiu um pouco disso, pelo menos comigo, em relação a figura do monstro (mas não além disso), fiquei e continuo presa em sua identidade, alguns a viram como a morte, como o diabo, para mim não era nenhum dessas, mas uma entidade que me remeteu a Fortuna e a algo similar as figuras mitológicas das Nornas/parcas/moiras e que nunca saberei, porque não era preciso que fosse explicado. Acho que quebra um pouco o encanto quando a obra explica, "obvializa" para ser entendida ou apreciada.

Como disse, me considero bastante política, mas acredito também, em parcimônia, militância demais exaure e creio que estamos próximos desse ponto, se é que já não o cruzamos e as mensagens acabam deixando de cumprir a função que deveriam. Sempre vem a memória parte do discurso do Oscar Wilde na introdução de O retrato de Dorian Gray, em que diz que "Theres no such thing as a moral or a imoral book. Books are well written, or badly written. Thatt is all... No artist desires to prove anything. Even things that are true can be proved. No artist has ethical sympathies... The artist can express anything... All art is at once surface and symbol." Um discurso deveras polêmico kkkkk, mas acredito que possui um quê de verdade nessa era em que tudo precisa ser correto, suave, sem gatilhos, ético, politizado.

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Out 19, 2023Gostado por Cristhiano Aguiar

Nossa, também, acho um saco este didatismo atual, apesar de não ter focado neste aspecto da série, enquanto via.

Achei um pouco cafona alguns aspectos dela, em especial o Corvo em si (a Gugino, que é uma boa atriz; o exemplo que me vem imediatamente é a da roupa e da postura dela na festa do Prospero, que me pareceu, de uma forma geral, muito uma fantasia puritana acerca de como é uma orgia) e o Pym (apesar da personagem na própria série ser muito interessante, achei ela pouco explorada e visualmente concebida de forma meio meh). Eu sei que há algo possivelmente cafona no gótico, mas é tão bom quanto fica só no possivelmente.

Midnight Mass é excelente, mas, para mim, tem algo que faltou: a V word. Eu acho que a série não teria perdido nada se eles tivessem aprofundado a discussão da ambiguidade das manifestações sobrenaturais (existente mesmo na Bíblia, na qual os anjos sempre geram temor quando aparecem) a partir da discussão sobre o fato da criatura ser um vampiro. Mas o próprio Flanagan falou que não falou porque não quis... Aí o buraco é mais embaixo, né? kkkk

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Legal Guilherme! Olha, eu curto a coisa cafona da Corvo (ou do Corvo? do Corva?) na série. Sim, eu comentei com amigos que não gosto da cena da orgia. Na verdade, acho que o sexo é um dos pontos mais frágeis da série. No caso da V word em missa da meia-noite, eu curto essa escolha dele. Abraços!

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Eu terminei ontem e concordo contigo sobre o teor panfletário nos últimos monólogos. É um "eat the rich" bem literal. Gostei de qualquer forma, o Flanagan manda muito bem num geral (e compartilho contigo a preferência pela Missa da Meia-noite). Mas na defesa do didatismo, acho que andamos em solo muito escorregadio para abordar política em todos os meios de mídia. Num mundo atolado de informação e onde tudo tá virando entretenimento (estudar precisa ser divertido, informar os outros precisa vir empacotado num tom engraçado ou chamativo...) me parece que a sobriedade de um suspense com horror vai cair em alguma cilada sobre forma-mensagem para passar um discurso politizado. Difícil né. Eu também queria que as coisas fossem mais sutis, parece que é mais divertido (e até inteligente) assim. Mas acho que deu espaço para metáfora pro grande ressentimento entre gerações ali: o Acusador está fazendo as gerações seguintes pagarem pelo desbunde dos baby boomers, exatamente como o nosso mundo colapsando agora.

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Eu entendo teu diagnóstico, mas como falei no meu texto, eu identifico isso primeiro no meu próprio trabalho, antes de "acusar" outras obras de cair nessas questões. Creio que temos uma ansiedade da relevância imediata em nosso trabalho como artistas e essa ansiedade é um dos fatores que levam a essa questão que você tão bem diagnostica. No caso da metáfora do ressentimento de gerações, concordo demais com você, é uma leitura bem interessante da mensagem política da série e essa dinâmica eu na verdade acho bem realizada. Ah, mas há algo também que me chamou atenção em algumas manifestações reclamando da série a partir do mesmo ponto que crítico: bastante gente se posicionando numa espécie de "ar superior", porque identifica esses elementos didáticos e já reduz a série a isso, como se ela tivesse só isso a oferecer. E creio que ela é uma série bem boa e que sofre de imperfeições, como toda criação artística. Não curto também esse senso de superioridade, bem egocêntrico, dos críticos de plantão das redes sociais. Um abraço pra você!

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Nossa, concordo demais. Tudo muito direto e raso, sem espaço para maiores reflexões. Adorei o texto. obrigada! beijos.

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Mas, por outro lado, há outras camadas e momentos na série que compensam esse problema. Um abraço e obrigado pela leitura!

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