Os três tipos de livros sobre o ato de escrever
E algumas novidades: meu novo curso de escrita, participação em evento na França e minha entrevista mais recente.

Amanhã, dia 18/03, começa minha nova oficina literária. Será a primeira vez que dou uma oficina literária 100% online (eu já tenho bastante experiência em ministrar cursos livres online sobre literatura, mas escrita criativa será a primeira vez). Meu curso, chamado Escrevendo literatura fantástica, acontecerá na plataforma do Instituto Caminhos da Palavra. As inscrições estão abertas e ainda dá tempo, para quem estiver interessada(o), de se inscrever! Aproveitando esse gancho, quero comentar com vocês, brevemente, o que considero serem os três tipos principais de livros sobre escrita.
Os três tipos de livros sobre escrever (literatura)
Existem três tipos de livros sobre o ato de escrever literatura.
Quero só deixar claro que a divisão que proponho é mais didática do que “real”. Com isso, quero dizer que é difícil encontrar um livro que se encaixe 100% numa tipologia. Assim, um Livro A tende a se encaixar numa categoria X, por exemplo, pois a maior parte do seu conteúdo se inclina a refletir uma característica predominante.
Eu adoro ler livros sobre como escrever.
Sempre há algo a aprender, ou a lembrar, neles. Os melhores livros funcionam, no meu caso, como um combustível que acende novamente a imaginação. Eu não vou para eles somente porque preciso preparar uma aula, ou porque estou empacado na escrita de algum texto e preciso vislumbrar uma saída. Há, no meu caso, um amor pela leitura destes textos; há um gosto por presenciar a alquimia verbal do laboratório dos escritores e escritoras.
Tipo 1 - O manual da boa escrita: é um dos livros mais comuns sobre escrever. Neste caso, não apenas ficção. Uso a palavra “manual”, porque eles de fato se configuram como um guia sistematizado sobre a prática da escrita. Com frequência, este tipo de livro enfatiza aspectos ligados à semântica e sintaxe. Os melhores manuais apresentam aos seus leitores-alunos uma dinâmica aberta no tocante às normas da escrita. Ou seja, assumem que existe uma gramática normativa, assumem que existem, em específicos contextos, formas mais consagradas de escrever e, apresentando as normas, também alertam a gente de que elas podem e devem ser descumpridas ou reescritas. Fujam de textos ou livros de escrita criativa com leis absolutas do tipo “não conte, mostre!”, ou “corte adjetivos! Corte advérbios! Seja concisa!”. Fuja de exclamações, no geral! Um ótimo livro do tipo 1 é o Escrita em movimento (Companhia das Letras), da
. Recentemente, esse livro me ajudou bastante a destravar dois pontos cegos de algo que tenho escrito nesse momento. Além disso, recomendo muito também o Manual de sobrevivência na escrita (Bandeirola), de e George Amaral. É um manual no sentido clássico, mas com a abertura para o amor pela linguagem.Tipo 2 - A jornada estrutural: Se o tipo 1 se concentra nos fatos da linguagem, o tipo 2 pensa a escrita em termos de modelos e vertentes. Se o Manual da boa escrita se conecta bastante com a linguística, os livros da Jornada estrutural estão mais próximos da história da cultura, ou da história da literatura. Nestas obras, o foco é no entendimento de padrões de escrita, que são sistematizados e ensinados. É o caso do ótimo O romancista ingênuo e o sentimental (Companhia das Letras), de Orhan Pamuk, no qual ele pensa dois temperamentos diferentes de escritores que, em sua percepção, traduzem perspectivas fundamentais para a escrita de romances. Outro exemplo é o Como funciona a fição, de James Wood. Parte Manual da boa escrita, parte Jornada estrutural, eu o coloco mais na segunda categoria, porque ele toma o realismo como o grande paradigma da escrita literária e a partir dessa ideia traça modelos de escrita. O livro de Wood é, ainda, mais ligado ao tipo 2 se pensarmos que ele analisa o mecanismo fundamental da ficcionalidade em si. Por fim, o tipo 2 é bem frequente também no campo da literatura fantástica e da literatura policial, por exemplo.
Tipo 3 - A autobiografia literária: Aqui, senhoras e senhores, se encontra meu tipo favorito. Me refiro às obras viscerais, imersas na vida de seus autores e autoras, obras que pensam a escrita como experiência vital e estruturante do próprio ato de existir. Nestes livros, os autores abrem seus corações e, dentro deles, percebemos que desde muito cedo, geralmente desde a infância, foi montada uma oficina de criação literária. Misturando relatos de vida com bastidores da escrita de seus livros, ou com reflexões sobre o ato de escrever (lembrando, muitas vezes, os tipos 1 e 2), as Autobiografias literárias podem ser lidas como autênticos romances de formação não ficcionais. Dentre eles, meu atual favorito é um livro apaixonante, que li ano passado e me marcou: A louca da casa (Todavia), de Rosa Monteiro. Se você gosta de literatura, não deixe de ler esse belo livro. Além dele, recomendo muito Escrever é muito perigoso (Todavia), de Olga Tokarczuk (mas agora fiquei em dúvida se esse livro não se encaixa mais no tipo 2?), bem como Ensaio autobiográfico (Companhia das Letras), de Jorge Luis Borges. Creio que quando Conceição Evaristo escreve ou fala de suas Escrevivências, ela se aproxima do tipo 3 de reflexão sobre a escrita.
Estes são alguns dos livros sobre escrita que têm habitado minhas estantes e cabeceira ao longo dos anos. Se eu fosse escolher o preferido, seria A louca da casa, sem dúvidas. E continua o convite: se quiser escrever comigo este semestre, dá uma conferida no meu curso sobre escrever literatura fantástica. No segundo semestre de 2025, darei ao menos dois cursos de escrita criativa: um sobre contos, totalmente online, e outro mais uma vez sobre literatura fantástica, desta vez presencial.
Printemps Brésilien: minha participação
De março a junho, organizado pelo professor da Sorbone Nouvelle Leonardo Tonus, acontece um dos principais eventos europeus sobre literatura brasileira, o Printemps Brésilien. Com o apoio financeiro do Mackenzie e da Capes, serei um dos autores da programação de março. Estarei em três eventos, que acontecerão em três instituições diferentes. Deixo a agenda abaixo:
24/03, às 16h: Le gothique, version brésilienne – Rencontre avec l’écrivain Cristhiano Aguiar (en français et en portugais): conversa com alunos do curso de tradução literária da Sorbonne Nouvelle, sob coordenação da professora Mafalda Borges Soares. Os alunos vão traduzir textos meus para o francês. Falaremos sobre essas traduções e sobre literatura brasileira.
26/03 às 9h no Lycée Balzac: conversa com alunos do Liceu na companhia do trevoso Márcio Benjamin e com a presença das professoras Vanessa Carvalho e Mariana Figueiredo.
27/03 na Biblioteca Gulbenkian às 18:30h: converso outra vez com o Rei das Trevas Márcio Benjamin e com a Fada Suprema da Fantasia Brasileira
. A medição ficará por conta de Leonardo Tonus, Mariana Figueiredo e Bruno Matangrano. Esta é a minha mesa oficial do Printemps. Embora nossa mesa não esteja listada no site da programação oficial do Printemps, ela faz parte sim da programação, neste caso em parceria com a Gulbenkian.Todas as atividades são gratuitas e abertas ao público em geral. Estou bem animado! Vou fazer um diário de viagem aqui na newsletter sobre o que rolar em Paris.
Minha entrevista para o Rascunho
O Jornal Rascunho, um dos mais antigos jornais literários do país, tem uma seção chamada Inquérito, na qual os entrevistados respondem perguntas num esquema pingue-pongue. Em março, sou o entrevistado da seção. Dá para baixar o jornal todo em pdf aqui. Além disso, vocês também podem ler a entrevista e todo o conteúdo do jornal no próprio site do Rascunho.
Este é o primeiro de alguns conteúdos sobre escrita criativa que quero preparar ao longo do ano. Tem sido um campo profissional recente para mim, já que entrei de fato nele em 2022. No entanto, a escrita criativa tem cada vez mais feito parte do meu universo como professor e escritor. Vamos continuar a conversa sobre escrever nos comentários? Ah, também aceito dicas de Paris!
Até logo,
C.
Muito bacana as indicações e sucesso no evento em Paris!
Estava doida pra fazer o seu curso de literatura fantástica, mas várias aulas iam coincidir com uma viagem que faço agora! (Estou revelando isso apenas para deixar registrada a minha esperança de que venham outros cursos como esse!)