Linguagem Guilhotina #26 - E a Flip?
A partir de quarta-feira (22/11), acontece o principal evento literário do país e estarei por lá.
Transmissão da mesa que fiz com Cidinha da Silva como parte da programação principal da Flip 2022. A mediação foi de Nanni Rios. Se quiser assistir, é só clicar no vídeo acima, que tem a mesa na íntegra. Foi bem emocionante subir neste palco.
Todo mundo (no meio literário) só fala dela: a Flip!
Ok, todo mundo só estar falando da Flip, aqui no nosso divertido meio literário, é um tanto de exagero, porém é difícil que alguém interessado em literatura não tenha visto uma postagem, uma reportagem, uma lista de autores, ou a programação de alguma das casas paralelas, por exemplo.
Nós temos no Brasil um conjunto variado e numeroso de eventos literários. A maioria deles sobreviveu a crises econômicas, a um impeachment, a Bolsonaro, à pandemia. É uma resiliência bem impressionante. A Flip é uma das sobreviventes. Por que ela é tão importante? Porque o seu surgimento, há vinte anos, ajudou a desencadear uma renovação nos eventos literários do país. Além disso, durante anos, a Flip ditou a pauta do debate literário nacional. Ela continua influente dessa forma? Sim, porém eu sinto que bienais como as do RJ e de SP, além da Feira organizada, aqui em São Paulo, pela revista QuatroCincoUm, têm dividido com a Flip o protagonismo. De qualquer forma, a Flip ainda se faz ouvir. Anos atrás, a Flip, por exemplo, contribuiu para que o debate sobre raça se tornasse uma das pautas principais da conversa sobre literatura que temos hoje.
É preciso atentar para algo fascinante a respeito da Flip: ela hoje em dia não é somente um festival literário. A maioria dos outros eventos literários do país não tem programações paralelas à sua programação principal. A Flip, sim, e isso faz um bem danado para ela. Neste sentido, a dinâmica que ocorre em Paraty se assemelha a das bienais, que com frequência tem programações independentes, paralelas, em relação à programação principal.
Desta maneira, “Flip” se tornou não mais o nome de um festival literário. “Flip” se tornou o nome de um ecossistema complexo, no qual o sistema literário do país se encontra, se tensiona e vive suas próprias contradições. A Folha de São Paulo tem a sua casa na Flip, onde rolam as programações, assim como coletivos de escritores ou editoras independentes.
Na primeira Flip que fui, em 2018, eu basicamente colei na Casa Fantástica, que foi um espaço onde estavam vários dos autores, 90% independentes, de literatura fantástica do país. Logo, no espaço das poucas quadras do centro histórico de Paraty, ocorre não um evento literário, mas no mínimo dez eventos literários simultâneos, cada um deles com uma programação variada o suficiente para ser, por si só, um evento principal.
Na Flip, o ecossistema é composto por parte considerável do mundo editorial brasileiro e estrangeiro. Livreiros, editores, agentes literários, tradutores, educadores, curadores… e leitores e autores. E aí é saudável ir para a Flip de coração aberto. Ir solto e solta, buscando se divertir o máximo possível. Escrevi “possível”, porque a Flip, ir a uma Flip, nunca deixará de ter a sua dimensão de trabalho para nós que somos profissionais da palavra. O melhor, portanto, é ver as mesas legais, encontrar com os amigos, se esquivar dos inimigos e nunca se levar tão a sério em um evento que, afinal de contas, começa com a palavra “festa”.
Você frequenta há anos a Flip, Cristhiano?
Na verdade, não.
Minha primeira Flip foi em 2018, quando participei da programação paralela do Barco Pirata da Flipei para lançar meu livro de contos Na outra margem, o Leviatã, publicado pela Lote 42. Durante muitos anos, eu tinha essa coisa de autor indie que tinha muito preconceito com a Flip. Em parte, há ressalvas a serem feitas, sim, mas que se aplicam a qualquer evento de grande porte no Brasil. Os nossos grandes eventos sempre vão lidar com as profundas desigualdades do nosso país. E creio que em alguns anos anteriores a Flip foi sim muito branca, muito Sudeste, muito nariz empinado. Por outro lado, não ter ido na Flip até 2018 também se relaciona a fatores pessoais, ao profundo sentimento de inadequação que sinto em relação às coisas, isso desde que sou criança. A Flip parecia, portanto, uma festa a qual eu não devia ser convidado, ou que não era meu lugar.
Eu estava errado. Porque, em 2018, quando visitei o lugar pela primeira vez, vi mais diversidade do que imaginava, vi jovens de diferentes regiões do Rio, por exemplo, ocupando as ruas com declamações de poesia, ou com performances que me deixaram de queixo caído. Além disso, se o seu lugar literário não surge, dane-se os donos do lugar, junte seus amigos, ocupe, imponha seu espaço. Era assim que eu vivia a vida literária em Recife, quando morava lá, e sinto que perdi demais esse lado punk rock...
Fui de novo pra Flip em 2019, embora sem participar como autor convidado de nenhuma programação. Mas por isso mesmo foi o ano mais divertido de todos, até agora, até porque eu estava na companhia de amigos e amigas muito queridos. Aliás, foi o ano da Vaza Jato e as tensões políticas estavam absurdas. Isso, contudo, vale um texto próprio.
Em 2020 e 2021, a Flip foi online, devido à pandemia. Ela retornou presencialmente ano passado, quando participei dela como autor tanto programação principal, quanto de outras quatro mesas da programação paralela. 2022 foi então uma Flip diferente para mim, porque, de ilustre desconhecido, de repente eu me tornei um dos seus protagonistas naquele ano. Como disse na legenda do vídeo da transmissão da minha mesa, foi uma emoção subir naquele palco, assim como foi muito recompensador viver os quatro dias da Flip de 2022 e ver a repercussão significativa do meu trabalho, trabalho esse que faço há tantos anos.
Qual a sua programação para a Flip este ano?
Além de me divertir e de encontrar com pessoas queridas, farei três mesas da programação parela este ano. Quem viabiliza minha ida este ano é o Sesc. Caso contrário, talvez eu não conseguisse ir em 2023. Aqui está a minha programação:
23/11 - 14h - Quinta-feira - Sesc Santa Rita - Distopias urgentes com Joana Bértholo e Cristhiano Aguiar. Mediação: Schneider Carpeggiani.
24/11 - 10h - Sábado - Casa Paratodos - Cinco coisas verdadeiras com Cristhiano Aguiar, Eliane Robert Moraes, Felipe Charbel, Patrícia Lino, Pedro Meira Monteiro.
24/11 - 11h - Sábado - Casa Pagã - Uma investigação poética: mistério, crime e realismo fantástico com Cristhiano Aguiar, Luiza Romão, Fábio Dobashi Furuzato, Anita Deak.
Havia uma quarta mesa da qual eu participaria, na quinta-feira também, mas ela acabou sendo cancelada (faço referência a ela porque eu já a tinha divulgado semanas antes).
Espero muito encontrar vocês por lá. Se a gente não se conhece pessoalmente, mas você tem gostado desta newsletter e se me encontrar pelas ruas de Paraty, não esquece de me dar um oi. Será um prazer conhecer você.
E aí, vão para a Flip este ano, ou já foram? O que acham da festa? Como foram as edições anteriores, vocês que já foram para o evento? Me contem nos comentários. Continuemos a conversa aqui e, se possível, lá em Paraty.
C.
Oba, estarei lá!!
Fui ano passado na sua mesa com a Ana rusche foi lá que conheci seu trabalho. Foi minha primeira Flip e ter ido solta deu super certo! Esse ano estou mais organizada, mas com a mentalidade de ir e me divertir também! Boa festa, nos esbarramos por lá!