Linguagem Guilhotina #1 (V.2) - Vida-Garfield
De férias, compartilho pensamentos soltos, enquanto tomo meu cafezinho nesta tarde quente e sonolenta
O longo domingo
É janeiro: como vocês estão?
Tenho o privilégio de estar de férias, então as coisas caminham bem devagar por aqui.
Tenho lido bastante e assistido muitos filmes. Passei o final do ano em Minas Gerais com minha namorada e saí de lá encantado tanto com Belo Horizonte, quanto com Ouro Preto, as duas cidades que visitamos.
Eu de fato não tenho grandes assuntos para tratar com vocês hoje, a não ser compartilhar o quanto aprecio este período do final do ano e início do próximo. Sei que podem ser períodos aterradores por motivos diversos, entre eles, em especial, tragédias e desavenças familiares. O fim/início de um ano também pode ser desgradável, porque para muitas pessoas a época possui a dimensão existencial de um longo domingo. Ou de um feriado no qual não existe nada para fazer.
O meu e-mail em janeiro começou com algumas boas notícias, entre elas convites para dar alguns cursos ao longo de 2024. Também quero voltar aos meus livros antes de iniciar o meu semestre de aulas no Mackenzie, porém me sinto incapaz de mexer em qualquer coisa de trabalho nesta segunda semana do ano. Ainda estou curtindo meu direito a uma vida-Garfield.
E também aconteceu algo preocupante: assim que voltei de Minas Gerais, meu notebook apresentou problemas. Na assistência técnica da Apple, me informaram que há a possibilidade de, no conserto da máquina, eu perder parte ou todos os meus documentos. Como vocês devem desconfiar, há mais de seis meses eu não faço backup, o que significa que posso ter perdido todo o arquivo do meu romance, cuja Parte II (devem ser quatro no total) eu terminei de escrever na véspera de viajar para Minas.
Também posso ter perdido uma novela que escrevi em Princeton, que faria parte de outro projeto de ficção, bem como 90% dos pdfs da minha pesquisa de Pós-Doc na biblioteca de Princeton. Estou em estado de aceitação, ainda, da situação, e escrevo para, sei lá, lidar com isso se o pior prognóstico acontecer. Lição: façam sempre suas cópias de segurança. Máquinas, afinal de contas, quebram, porque respeitam a tendência de entropia de tudo que existe no universo (aqui em casa, preciso lidar também com problemas na de lavar louça e no meu forno). Esta é a segunda vez que eu perco toda uma jornada de escrita. A primeira vez aconteceu com uma falência total de um computador ali na passagem de 1999 para 2000, quando perdi boa parte da literatura que eu tinha escrito febrilmente na adolescência. Isso incluía, talvez, uns dois romances.
“E agora?”, vocês me perguntam.
Se o pior ocorrer, vou recomeçar.
Não tem outro jeito.
Pelo menos, eu não perdi também o livro de ensaios sobre literatura brasileira que organizei e revisei em Princeton (sim, meu pós-doc foi bem produtivo). Acredito que volto a ele assim que as minhas aulas na graduação e na pós-graduação recomeçarem, porque creio que o retorno ao semestre acadêmico vai ser um estímulo legal para finalizar o livro. Tenho esperanças de publicá-lo ainda em 2024. Por outro lado, não há pressa. E, se eu tiver perdido o romance e a novela, então aí que vou demorar mesmo para lançar livro novo de ficção. Escrevo devagar e nos intervalos dos compromissos acadêmicos. É custoso.
Mas não quero deixar vocês chateados. É verão, é o começo de um novo ano. E tudo se transforma - uma perda é um renascimento. Como escreveu Baudelaire em suas Flores do mal: “Recordai! O tempo é um jogador que vai/Ganhando sem roubar, toda mão! É assim.” (trad. de Mário Laranjeira).

Alguns textos do fim do ano e começo de 2024
Participei de algumas enquetes, dei entrevistas, publiquei orelhas e textos críticos nas últimas semanas. Aqui vão alguns destaques. Próxima edição, divulgo mais.
A Redemoinho, ótima newsletter de literatura da Nonada, me perguntou qual livro/autor eu acho que deveria ser redescoberto em 2024. Indiquei Nove, Novena, livro de contos do autor pernambucano Osman Lins. Acredito que Osman é um autor que precisa de uma redescoberta neste momento tão interessante em que vivemos, no qual a literatura contemporânea brasileira tem passado por uma nova valorização;
Em minha estreia escrevendo para o Jornal Estado de Minas, resenhei o livro de contos fantásticos Kwaidan, cuja tradução mais recente foi lançada pela editora Fósforo. Gostei demais de Kwaidan, cujos contos são todos baseados no folclore japonês. Foi um orgulho colaborar com o Estado de Minas: considero que o jornal faz uma das melhores coberturas sobre livros e literatura no país;
A revista Quatro Cinco Um perguntou para seus colaboradores qual foi o seu xodó literário de 2023. Eu respondi que foi a obra da escritora estadunidense de romances policiais Dorothy B. Hughes, cujo excepcional romance O cavalo cor-de-rosa foi lançado ano passado no Brasil pela Harper Collins. Fiz o posfácio deste livro e ainda quero falar sobre Hughes aqui. Fiquei fissurado por seu estilo brutal e poético. Mas eu poderia também ter citado a literatura da escritora japonesa Sayaka Murata, que tive o prazer de conhecer pessoalmente em NYC ano passado;
Em 2023, o escritor cearense, radicado em Pernambuco, Sidney Rocha, lançou seu livro mais recente, O inferno das repetições. Gostei do livro e o considero o melhor romance lançado por ele. Sidney ganhou, há alguns anos, o prêmio Jabuti de melhor livro de contos pelo livro O destino das metáforas. Sua obra tem sido lançada de forma consistente pela editora Iluminuras. Resenhei o livro para o Suplemento Pernambuco.
É ótimo poder voltar a conversar com vocês por aqui.
Como estão as leituras do final do ano e de janeiro? Quantas máquinas quebraram até agora? Continuemos nos comentários.
Até a próxima semana!
C.
Sorte aí com o computador. Não faço backups primorosos, mas de tempos em tempos salvo arquivos importantes no google drive e me mando algumas coisas por e-mail. Longe de ser o ideal, mas já ajuda em caso de apocalipse.
Amando seus textos❤️